Planos de preparação

  • A preparação é o processo de garantir antecipadamente a prontidão para um surto de cólera, para que a resposta seja mais eficiente.
  • A preparação pode conduzir a uma resposta mais rápida e eficaz, reduzindo tanto a morbilidade como a mortalidade.
  • Um plano de preparação identifica as etapas necessárias para se estar preparado para um surto de cólera, incluindo atividades de análise de lacunas e reforço de capacidades, pré-posicionamento de suprimentos, bem como de materiais de IEC e respetiva adaptação, identificação de parceiros e acordos pré-definidos para a implementação e coordenação da resposta. Caso exista já um plano de preparação e resposta, deve ser feita regularmente a sua análise e atualização.
  • Quando o surto terminar, é essencial uma avaliação retrospetiva para identificar os pontos fortes e fracos da resposta, a qual visa ajudar a melhorar a preparação e resposta a futuros surtos.
  • Nos países em que os surtos de cólera ocorrem regularmente, para além da preparação e resposta a surtos, deve ser uma prioridade o controlo e erradicação da doença a longo prazo. Se ainda não teve lugar, os surtos são uma excelente oportunidade para iniciar este tipo de debate.
  • Muitos programas e atividades que fazem parte do planeamento da preparação contribuirão para os esforços a longo prazo.
  • Os planos nacionais de controlo e eliminação da cólera (PNC) devem ser elaborados em linha com o documento da GTFCC “Erradicar a Cólera: Roteiro Mundial até 2030”. (https://www.who.int/cholera/publications/global-roadmap/en/)
  • As atividades de preparação incluem:
    • reforçar a vigilância e garantir a notificação da cólera, incluindo relatórios zero;
    • efetuar reuniões periódicas com todas as principais partes interessadas envolvidas na coordenação e resposta ao surto, a fim de definir e/ou reavaliar a coordenação e o sistema de gestão da informação da cólera;
    • identificar zonas geográficas e populações em risco, através da análise dos dados epidemiológicos, relatórios e mapas de situações anteriores, cobertura sanitária e WASH, e qualquer outra informação contextual, por exemplo, informação climática, atualizações sobre conflitos e localização de campos de refugiados ou rotas migratórias;
    • analisar as principais orientações, protocolos e procedimentos disponíveis; se desatualizados, atualizá-los em linha com as normas mais recentes da OMS;
    • identificar a força de trabalho nacional, mapear todos os parceiros e descrever as suas funções e áreas de ação; avaliar a capacidade dos parceiros de preparar e responder a surtos de cólera;
    • identificar e mapear a atual disponibilidade de materiais e fazer uma estimativa das necessidades; incluir estas necessidades no atual sistema de compras para armazenamento e distribuição;
    • fazer uma estimativa dos fundos disponíveis e das fontes de financiamento para a prevenção, preparação e resposta;
    • realizar formação periódica e, se possível, efetuar um exercício de simulação, para praticar o processo de resposta antes da ocorrência de um surto;
    • em países vulneráveis à cólera, os planos de preparação devem também estar em vigor a nível subnacional, por região, distrito ou zona equivalente, dependendo da dimensão e estrutura do país.

Recomendações para melhorar a preparação

Detecção de surtos 

  • Com base em surtos anteriores, aferir a forma como as autoridades sanitárias foram notificadas do surto e identificar as principais fragilidades do sistema de vigilância, recursos disponíveis e procedimentos aplicados, a fim de aumentar a sensibilidade em matéria de deteção de surtos de cólera e melhorar a prontidão e eficácia da resposta.
  • Efetuar sessões de formação periódicas para os profissionais de saúde e agentes comunitários de saúde, para aumentar a sua consciencialização sobre a doença, definições de caso e procedimentos de recolha e comunicação de dados (devem integrar a formação em gestão dos casos).
  • Reforçar ou implementar a vigilância com base na comunidade para a deteção precoce de casos, notificação imediata e rápida implementação de medidas de controlo.
  • Ponderar a inclusão de clínicas privadas, médicos tradicionais, ONGs e organizações como a Cruz Vermelha Nacional e Movimento Internacional do Crescente Vermelho, e utilizar fontes não oficiais de informação (tais como jornalistas, líderes comunitários, professores).
  • Pré-posicionar TDR, material para recolha de amostras (copos de fezes ou zaragatoas retais e meios de transporte) em todas as unidades de saúde, nas áreas de alto risco de cólera. Realizar formação sobre o uso de TDR e recolha, acondicionamento e transporte de amostras de fezes. 
  • Criar equipas multidisciplinares formadas e preparadas para um destacamento rápido, para realizarem investigações no terreno e implementarem medidas de controlo iniciais.

Confirmação de surtos 

  • Divulgar as definições de casos padrão para os profissionais de saúde, antes da época prevista da cólera, para ajudar a aumentar a consciencialização e garantir um diagnóstico adequado. 
  • Avaliar e reforçar, se necessário, a eficiência dos serviços de distribuição de material e transporte de amostras. 
  • Garantir o fornecimento regular de material laboratorial às unidades de saúde relevantes, para a recolha e transporte de amostras de fezes para o laboratório de referência para confirmação. 
  • Assegurar que o laboratório nacional de referência e os laboratórios periféricos em áreas com surtos recorrentes dispõem de material adequado para realizar testes confirmatórios (cultura/PCR) e testes de sensibilidade antimicrobiana.
  • Rever as estratégias nacionais de ensaios e os procedimentos operacionais padrão. 

Organização da resposta

  • Establish a cholera coordination committee and ensure that they meet regularly in areas where cholera outbreaks are recurrent. This committee may need special funds in order to perform its essential coordination activities.
  • Identificar todas as partes interessadas e respetivos escopos de ação e capacidades, e envolvê-las no planeamento. Reforçar a colaboração entre o Ministério da Saúde, outras instituições e agências governamentais responsáveis pelo WASH, e parceiros.
  • Criar e manter boas relações com os doadores, realizando reuniões de informação regulares que forneçam dados sobre a situação epidemiológica, a eficácia da resposta ao surto e lacunas que persistam.
  • Preparar uma lista de materiais disponíveis e das necessidades previstas antes do surto.
  • Formar a equipa laboratorial em procedimentos operacionais padrão para a cultura de V. cholerae e testes de sensibilidade antimicrobiana. Garantir que a capacidade de testes é mantida. 
  • Estabelecer ligações com laboratórios de referência internacionais, para controlo externo da qualidade e para envio de amostras para posterior caracterização (como testes moleculares baseados em ADN), se necessário.  

Monitorização  dos surtos 

  • Formar periodicamente os profissionais de saúde em vigilância (definições de casos, recolha de dados e recolha e comunicação de dados) mesmo quando não há surto. Tal como acontece com a deteção de surtos, isto deve fazer parte da formação que inclui a gestão de casos.
  • Efetuar a análise periódica dos dados de base (tempo, local, pessoa) antes da época de cólera, para poder comparar os dados entre anos.
  • É também recomendável a identificação dos “focos” (zonas onde normalmente ocorrem os surtos).

Tratamento e unidades de tratamento da cólera

  • Organizar regularmente formação específica em gestão de casos, destinada aos profissionais de saúde. Criar um plano de formação que vise alcançar a formação da totalidade dos profissionais de saúde. A formação deve também incluir definições de casos, recolha de dados e comunicação para melhorar a deteção e monitorização de surtos.
  • Identificar locais para UTC/CTC antes da ocorrência de um surto. Garantir o fornecimento dos materiais necessários para tratar os pacientes.
  • Preparar com antecedência a descrição individual de funções dos funcionários de UTC/CTC.
  • Reforçar as medidas de PCI através de formações regulares de todo o pessoal a trabalhar nas unidades de cuidados de saúde.
  • Fornecer protocolos de tratamento padrão a todas as unidades de saúde.
  • Garantir que as atividades de WASH, incluindo a gestão de resíduos, estão a funcionar nas unidades de cuidados de saúde e se baseiam nas normas nacionais. Organizar formações específicas, se necessário.
  • Armazenar os materiais a nível distrital, em zonas de risco elevado de cólera, para facilitar a sua rápida distribuição.
  • Não limitar o material pé-posicionado ao que se destina a tratar pacientes, tais como líquidos EV e SRO. Incluir materiais para a PCI e WASH, por exemplo, sabão, cloro, equipamento de monitorização da qualidade da água, baldes, pontos para lavagem das mãos, camas para cólera e equipamento de proteção individual.
  • Em unidades de saúde remotas, garantir o fornecimento de materiais e medicamentos para tratar os primeiros 10–20 pacientes, dado que os insumos levarão algum tempo para chegar a estas zonas, uma vez iniciado o surto.

Promoção da saúde e higiene, mobilização social e envolvimento comunitário

  • Envolver as comunidades em risco no plano de preparação para a cólera. Identificar e dar formação às pessoas designadas pela comunidade, por exemplo, os membros respeitados, representantes religiosos e elementos de grupos de jovens e de mulheres.
  • Antes da época da cólera, organizar debates em grupos de reflexão nas comunidades de risco elevado, com vista à identificação de lacunas em matéria de conhecimentos sobre a prevenção da cólera.
  • Preparar, atualizar e distribuir materiais de IEC nas zonas de risco elevado, antes do início do surto.
  • Verificar se o sabão e os produtos para tratar a água estão disponíveis e são acessíveis para a comunidade, desenvolvendo programas em conformidade.
  • Avaliar o impacto das mensagens utilizadas anteriormente e melhorar ou adaptar a comunicação com as comunidades.
  • Manter a mobilização social e o envolvimento comunitário no âmbito da prevenção da diarreia, ao longo do ano, integrando as atividades a nível da comunidade, intensificando-as antes da época da cólera, sobretudo nas zonas de risco elevado.
  • Conduzir a promoção a longo prazo, de práticas de higiene e saneamento como a lavagem das mãos com sabão, a eliminação segura das fezes das crianças e a utilização de instalações sanitárias para defecar.

Comunicação de riscos

  • Desenvolver uma estratégia de comunicação e definir as principais mensagens de prevenção da cólera antes de um surto. Identificar meios de comunicação eficazes com a população.
  • Designar um porta-voz e definir procedimentos de comunicação de riscos, para dar resposta às perguntas mais frequentes acerca da cólera e a forma de a prevenir.
  • Estabelecer relações com os meios de comunicação social e utilizá-los para promover atividades de envolvimento comunitário, e recorrer às estruturas locais para debater conselhos de saúde pública.
  • Utilizar os canais de comunicação locais (por exemplo, painéis informativos, encontros, redes sociais) para transmitir mensagens preventivas.

Acesso a água potável e higiene 

  • Incluir disposições de emergência de produtos químicos, para tratamento de água, equipamento e material para testes de qualidade da água, geradores de energia de reserva e materiais e produtos para pré-filtragem, armazenamento e sedimentação de emergência, como parte dos stocks de emergência.  
  • Reforçar a segurança alimentar, incluindo estações para a lavagem das mãos em locais públicos (por exemplo, mercados, vendedores ambulantes) e em encontros, por exemplo, funerais.

Práticas de enterro seguras e dignas

  • Antes da época da cólera, organizar uma lista simples das principais recomendações para os profissionais de saúde prepararem os cadáveres em segurança para o enterro.
  • Preparar devidamente os membros da comunidade, para que os enterros se realizem de forma segura e digna.
  • Se possível, averiguar as práticas funerárias locais, para identificar alguma suscetível de transmitir a cólera e identificar práticas alternativas.

Vacinação com VOC

  • Garantir que todos os procedimentos para a importação das vacinas, por exemplo, o registo, estão completos para a VOC.
  • Informar os decisores e os profissionais de saúde acerca da VOC, incluindo como aceder a ela e como conduzir uma campanha.
  • Desenvolver ferramentas para uma campanha de vacinação, por exemplo, modelos de fichas de registo e mensagens de comunicação, preparando os profissionais para o uso da VOC em caso de surto ou crise humanitária.

Intervenções de longo prazo

  • Em muitos países, a cólera ocorre sazonalmente e em áreas limitadas (Áreas Prioritárias para Intervenções Multissectoriais (PAMI)). Intervenções abrangentes e multissectoriais dirigidas às PAMI devem conduzir ao controlo a longo prazo e até mesmo à eliminação da cólera. 
  • As medidas a longo prazo para controlar a cólera e outras doenças diarreicas devem centrar-se em melhorias sustentáveis do abastecimento de água, saneamento, segurança alimentar e sensibilização das comunidades sobre medidas preventivas.
  • Os países onde a cólera é endémica ou que vivem surtos de cólera recorrentes devem considerar que esta doença é um problema de saúde pública de prioridade elevada e desenvolver e implementar um PNC.
  • Os PNC devem contemplar uma abordagem multidisciplinar, para garantir que as intervenções de longo prazo são complementares e executadas em sinergia.
  • As intervenções devem visar as PAMI identificadas em todo o país e devem concentrar-se em: 
    • WASH – implementação de soluções adaptadas, de longo prazo e sustentáveis nesta matéria, que visem a população com maior risco de cólera;
    • vigilância e comunicação – vigilância de rotina eficaz e capacidade laboratorial nos níveis periféricos, para confirmar casos suspeitos, informar a resposta e acompanhar os progressos no sentido da eliminação;
    • reforço do sistema de cuidados de saúde – maior prontidão para os surtos de cólera através do reforço das capacidades dos profissionais de saúde, deslocação de recursos e material para diagnóstico, cuidados aos pacientes e intervenções WASH de emergência;
    • uso da VOC – vacinação em larga escala para reduzir imediatamente o fardo da doença, enquanto são postas em prática medidas de longo prazo de controlo da cólera;
    • envolvimento comunitário – comunicação melhorada no âmbito das estratégias de controlo da cólera, promoção da higiene, riscos da cólera e acesso ao tratamento, através da mobilização dos líderes comunitários;
    • liderança e coordenação – coordenação intersectorial e construção de uma estratégia forte de preparação e resposta.

Para mais informação

  1. Cholera outbreak: assessing the outbreak response and improving preparedness. Global Task Force on Cholera Control. 2010 Click here
  2. Ending Cholera. A Global Roadmap to 2030. Global Task Force on Cholera Control. 2017. click here